segunda-feira, 1 de abril de 2013

Nome lacrado





Agora, no escuro entre balcões e mercadorias, deito-me com fones nos ouvidos, a pistola à altura das mãos. Quando acordar, investigarei, debaixo da camada de tártaro dos dentes tortos da minha pequena notável, o nome. Não, melhor não procurar porra nenhuma. Todas as mulheres, ao revelarem os nomes, abrem um dicionário de centopeias carnívoras especializadas em degustação de desastres amorosos. Sim, nomes lançam nexos, laços, algemas. Nomes exigem biografia e memória, apontam tangências, confluências, margem mínima de afinidades. Nomes são feridas inscritas em corpos de próteses e instantâneos com tintas tragicômicas. Nomes são matilhas furiosas que me perseguem em filas de emprego e ocupações de sem-teto. Alguns tiram fotos, mandam e-mails e torpedos, gostam de gafieira. Permaneçamos, meu bem, indecifráveis anônimos vagabundos. A noite tem pernas curtas. Algum nome secreto abre com estridência a porta da loja e, ao tentar reacendê-la no grau cinza da rotina, pisa o meu pé esquerdo. Arma já bem guardada na cintura, levantei-me incontinente. A situação era absurda. Felizmente não havia explicações. Minha musa-manequim esculpida em espanto no interior de magazine muquirana, diva no meio de bugigangas chinesas e paraguaias. Era o meu paraíso: o reino de notas frias, de cédulas falsas, de mulheres chaves de cadeia, de minha subliteratura.



Um comentário:

  1. Nomes? Há quem os troque... E, assim, deixam de carregar entulhos por outros depositados...
    Abraço, Célia.

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