domingo, 17 de março de 2013

TRÍPTICO

Manabu Mabe
























I

Feminua
na concha da lua cheia.

Noturna sereia,
no cabaré da Lapa
não cabe
a indecisa nudez.


Peças
saltam ao chão,
desenham um pecado de cada vez.

Sombras de prímulas trêmulas
ao som de paredes perfuradas
por tristes tangos redondos
- sonoras crateras lunares
em que ávidos sorvemos
a vida sabor de vinho e contrabando.

Nosso clã
                nosso destino
                                          nossa idade


Clandestina claridade,
árvore onde inventamos
o verde
a levitar e inverter
a verdade:
essa versão falsificada de felicidade.

Feminua
é quando o salto se inaugura.



II

Ser a chuva sobre,
a água jogada aos pés
ou o vento invasor, talvez.

Mínimo movimento
em direção à perda de lucidez.

Diria, em outra pauta,
rumo à implosão
ou à falência das palavras.

Ir ao encontro do
beijo mais aceso,
esse, semelhante a selo
com o qual se lacra
a intensidade que escapa.

A chuva,
sobre a sombrinha,
soberana.

Quem determina
a cadência com que se afirma
a proteção redonda
dentro da qual caminha
elegância bailarina?

Qual proteção?! Que nada!
A sombrinha é que socorre a chuva
do sol que a segura e nasce a cada passo.

A sombrinha,
inversão completa:
passarela suspensa e portátil:
alumínio, nylon e poesia.



III

A cidade era uma rede de ruas
onde o progresso apagava a paisagem,
acumulava crimes e cicatrizes
e traçava em seco mapa suas margens.

Na verdade, já não existem cidades.
À falta de asas, de olhos e de encanto
avenidas são feridas urbanas,
enviam invisibilidade a todos os recantos.

Nenhum projeto urbano
rima com felicidade.
A cidade, então, é você,
toda,
inteira.

Praia, peito, ponte
onde circula a claridade
e pássaro solar 

dança no horizonte
além das salas secretas

uma cidade
flutua
sobre hálito incandescente.

Uma cidade deitada
derruba todos os muros,
incomensurável
entre paredes.


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